segunda-feira, 19 de abril de 2010

Luz, sorrisos e nenhuma poeira

Varri as escadas, conferi cada canto da janela após abrí-la, limpei sobre a geladeira, acendi um incenso, peguei o chá e o livro. Percebi que não havia sequer poeira no mundo. Tudo era lúcido, plástico, liso e puro. Pura sutileza, qualquer palavra e eu sairia ilesa. Tons mágicos entoavam a tarde que em qualquer outra época seria sombria. Mil perguntas, nenhuma resposta e todos os sorrisos, o melhor de mim, o vibrar de cada instante. O hoje, o agora fazem um raio intenso de luz, muita luz, luz demais. A cegueira possuiu cada parte de mim, cada célula morta ou viva. Ineditamente mordi os lábios, claro pura ironia. Vi aquele clarão de abertos braços, sem freio, sem dor. Queria mesmo apagar-me ao sol e vislumbrar corriqueiras coisas. Um abraço, um corpo nu e todo meu orgasmo de mim. Deixe-me assim se quiser, me mande embora ou não. Pra mim hoje e amanhã podem até lacrimejarem, mas não nenhum instante, sou fria, quente, morna. Sou tudo, sou nada. Que nada não se refaz? Me diga da cor dos meus olhos na luz, dos tons rosados dos meus seios, mas não me diga de receios, de meios termos. Hoje eu preciso do beijo, do tato, do orgasmo. Preciso do sentir, do saber e do olhar. Não vivo de pouco, nem de muito, apenas quero olhar, viver. Das observações que faço não paro. Sigo, corro e meu peito trepida. Sou sem teto, caída e ao mesmo flutuo em berço. Raízes, raízes, minhas raízes aéreas. Não me prenda no chão, só me faça voar.

domingo, 11 de abril de 2010

Isenção

Cheguei a conclusão que o amor deve ser livre, essa coisa de alguém ter que ser de alguém necessariamente me irrita, aliás a alma deve ser livre, o pensamento deve ser livre, tudo, o que deve reinar em nossas escolhas é a felicidade, mesmo que seja momentânea.
A vida deve ser movida de vontades, sei que eu vivo dizendo que a gente tem que arcar com as conseqüências, que a gente tem que pensar antes, que existe toda uma vida e as coisas todas que envolvem mil pessoas, que temos que ser conseqüentes, mas daí eu me deparei com a minha vida. Sou toda velha, chata, cheia de princípios e regras de modo de vida. Quis me libertar dessa corrente toda de boa menina que me envolve. Libertar-me e me permitir ser jovem, inconseqüente, irreverente, mesmo que pela minha situação no zodíaco eu ainda mantenha meu pé no chão.
Não estou dizendo que você deve ser um total libertino, longe disso, estou dizendo que suas entranhas são só suas e de mais ninguém, que sua felicidade deve ser feita por você e pelas coisas que lhe parecem necessárias para ser feliz. Que talvez a vida deva mesmo ser movida por impulsos, que os riscos são caminhos também. Deve-se pensar em quem se atinge, mas ser egoísta as vezes pode salvar o mundo, o seu mundo.
Estamos tão acostumados a tudo que nos parece normal pela convivência que ignoramos que talvez o que parece loucura é apenas uma questão de hábito, nos adaptamos a ignorar nossos instintos, nos adaptamos a não questionar princípios, a se privar do obvio e do que lhe abre o olho e saliva a boca, apenas devido a meias verdades que nos contaram no berço.

sábado, 10 de abril de 2010

Metamor-fases

É incrível como as coisas não são sempre como a gente acha que são. Num dia nossos princípios são intocáveis e não aceitamos nenhuma palavra que possa ferí-los. Cheguei a conclusão de que realmente esses princípios e formações de vida fervorosos que as pessoas adquirem pra elas são nada além de uma ilusão jovial.Trata-se da fomentação de algo que não pode ser real, porque nada é real. O transitar incansável das coisas faz com que tudo não passe de seres modificados e objetos encapados pelos ventos do mundo. A verdade de agora não é mais. É assim, simples assim. O que quero dizer, não é que você não possa vir a formar opiniões, mas sim que o passar tempo olhando e dizendo o que você não faria, o que você é contra e tal e coisa é banal. Porque amanhã você pode fazê-lo assim como eu o fiz e o máximo que irá acontecer é você opinar por lavar a alma ou deixar que pese sobre você.

Lavada alma de corpo limpo, cheiro de mel

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Luas, lembranças e serpentes

Cuidado, ando meio a flor da pele, meio torta no meio-fio. Vejo o frio e lembro-me de sorrisos virados cheios de cobertores e odores. Talvez a lua cheia em uma quadra vazia de corpos, mas cheia de recordações. O sol que tenta aquecer mais um dia gelado lá fora, me lembra das chuvas e nevoeiros carentes, da gente contente em imagens e ação e bancos imobiliários, sem imóveis e mobílias.
Estado de espírito, sem meio argumento, é apenas isso. Talvez uma metralhadora, daquelas que atira a todos os lados e que mal percebe que foi atingida pelo verdadeiro alvo. Bosta, três mil e oitocentas vezes, digo! Talvez pique - esconde com mãos dadas. Demasiado utópico.
Foi-se o tempo da valorização. Alguma vez você se sentiu incompleto acompanhado e completo sozinho? A vida é um moinho!
Nada digo e nem quero dizer, mas digo "cuidado", novamente e de novo, eu posso vir a fazer propostas indecentes, não aceite! Às vezes eu sou serpente.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Ô

Aflige a alma
que esperneia
agoniza o mundo
te despenteia
ser de lá
de cá, sei lá
ser de alguém
ser só
tocar
sorrir vibrando
ou desespero
do instante sano
do medo
Aflige o peito
que harmoniza
não, talvez
de dia branco
orgulho franco
carrancudo
fresquinho
ser meio inteiro
carinho

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Depois do vinho, espumas

Alguma música lutuosa tocava quando entrei na varanda, o portão encontrava-se entreaberto creio que era mesmo para mim. Ouviam-se soluços e o porquê do meu não soluçar cortava-me também. As mulheres têm a tal mania de cavar suas próprias covas e eu queria poder entender. Sei que falam de rosas e amores, mas eu não sei por onde andei que não quis mesmo com porque entregar-me a isto.
O meio cômodo da cômoda, minhas blusas jogadas misturadas com espumas de travesseiros, creio que resultado de um acesso de raiva. Ainda não chorei e nem sei se vou. Agonizo por não sentir e sinto por agonizar.
Fechei os olhos, dei um passo e "boom", o disparar do meu peito foi tão grande, tão instintivo, tão, como poderia buscar palavras? Foi mesmo um tiro, ao mesmo que acelerou com a adrenalina, congelou com a perda de sangue. E eu que nada sinto, vejo então como se meu corpo estivesse vivendo tudo isso, todo esse sentimento misto de perdas e ganhos e angustias, sei lá. E fico ali em cima, pairando pelo ar, vendo tudo que acontece com ele e com o outro corpo.
O olhar ainda não me viu. "Só vim pegar as coisas", "as coisas", "minhas coisas", repito mentalmente, meus lábios movem-se e nenhum som, nem mesmo um grunhido. Aquele corpo que mais parece jogado as traças, que transborda líquido, que se perde ao chão, parece não ter vida. O que foi que houve? Sinto-me completamente desconectado do mundo, não consigo juntar as memórias, as informações e entender o porquê daquilo tudo, parece que alguém se perdeu, por quê? Porque esse parecer?
Não sei das cores, nunca soube de amores.

domingo, 4 de abril de 2010

Vinhos e palavras

Pedi um copo d'água com gelo, sentei-me a mesa esperando a paz. Quis também um cigarro e uma taça de vinho, a música era possivelmente inspiradora, mas não sei. A vitrolinha estava meio bamba ainda sim o som era mais real que o do mp3 que eu havia comprado dois dias atrás, tocava meus ossos largos. Abri o caderno e resolvi por nele as palavras que não me pertenciam, o discurso que havia ouvido há umas duas horas ainda ecoava em minha mente e mesmo se refazendo fielmente a cada vez eu não conseguia absorvê-la.
"Palavras, palavras e palavras". Era assim, como se não houvesse coerência, palavras e mais palavras que me pediam piedade e compaixão talvez, queriam expressar a vontade de lutar por dois, mas minha cabeça rodava e rodava e nada. Pensei que escrevê-las ajudaria, nunca houve em mim a incompreensão textual, a fazia noite e dia. Mesmo assim ainda eram palavras sem sentido e me tornavam cada vez mais fria. O gelo derretia no copo entrando em equilíbrio com meu corpo, sem nexo, meu corpo estava mais frio que o gelo. O vinho descia-me deliciosamente pela garganta e eu desisti do cigarro, eu sabia que em vão. Tentei mil vezes largar esse hábito. E o vazio no papel.
Levantei-me, o dinheiro posto junto ao copo suado e caminhei meio desconecto até a casa, eu nem me direcionei, foi mecânico, pobre corpo, mal sabia que havia sido jogado fora de lá.